Um dia desses cheguei tarde em casa, procurei em todos os cômodos por algum habitante que me respondesse onde estavam meus chinelos, por último, passei no quarto da minha irmã já sem esperanças de que ela estivesse lá sem ouvir meus gritos. Quando abri a porta e acendi as luzes, deparei-me com Dhiéberson de cabeça posta num travesseiro amarelo em forma de sol, quando ele abriu os olhos com toda sua lentidão debochada, olhou bem dentro dos meus, e parecia querer-me dizer algo. Cheguei mais perto e senti que o havia incomodado, então, firmei meus olhos como quem reage a uma provocação. Mas não teve jeito, ele sempre vence meu olhar, parecia me dizer com os olhos: O que você quer? Virei as costas e me retirei para não perder a cabeça e jogá-lo na rua. Ele é realmente podre!
Na hora de comer, o que ele só sabe fazer além de dormir, minha irmã mexe no saco de ração, que tem que ser sabor peixe com flocos de ervilha (se não for essa ele nem cheira) e logo ele fica todo “ouriçado”. Balança o rabo como se fosse um cachorro, come feito um porco e depois dorme como um bode. Ele parece com tudo, menos com um gato.
E outra, se um dia for constatado que no mundo felino existe homossexualidade, terei certeza de que ele é gay. Pois Dhiéberson não faz nada que os gatos machos costumam fazer. Ele não briga, não corre, não pula, não fede a peixe, não mia, nunca sumiu nem cruzou, e para piorar, só se lambe na frente do espelho, como tivesse se escovando na frente de uma penteadeira.
Até que ele não é feio, tem uma cara larga, como um paraibano e a fuça bem avermelhada, minha irmã que o diga. Vive apertando aquele bicho. Talvez gostasse dele se não fosse um poço de arrogância. Ele não é meu inimigo, já tentei acariciá-lo algumas vezes, mas ele simplesmente me ignora, gosta de me irritar e me classificar como insignificante.
Ele é absurdamente esnobe e abusado, contando ninguém acredita. Certo dia, em uma das poucas vezes que foi levado à rua, um cachorro branco e grande cismou de enquadrá-lo com latidos assustadores, Dhiéberson simplesmente piscou calmamente os olhos e virou-se de costas, o cachorro latiu mais umas duas vezes e acabou indo embora de tão sem graça, deve ter ficado com a auto-estima lá embaixo.
Já vi de quase tudo nesse mundo, sogra chata, primo pentelho, velho rabugento, vizinho quizumbeiro... Mas gato metido? Dhiéberson é o primeiro, e espero que seja o último.
Thiago Sicuro