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quarta-feira, 16 de julho de 2008

FORMALIDADES À PARTE

Algumas pessoas confundem formalidade com boa educação, e acabam fazendo disso um bom motivo de risadas para os observadores de atitudes. Isso é fato.
O uso excessivo das palavras que julgamos bonitas de serem faladas, sílabas encorpadas e sons estonteantes, pode resultar em cenas tão desnecessárias quanto as mesmas.
Aliás, se falar bonito fosse sinônimo de boa educação, formalidade seria matéria do colegial. Que a pura verdade seja dita, na maioria das vezes torna-se tão ‘bonito’ que alcança a vulgaridade, ultrapassando a tolice e já chegando ao ridículo, essa é a parte cômica da história, a melhor parte.
Basta sentar-se por um curto espaço de tempo em um boteco de esquina que disponha de banheiro, e verá que ao menos três pessoas ainda sóbrias dirão a mesma frase ao balconista. __ Ô amigão, será que eu poderia dar uma urinada no seu miquitório? “Urinada no seu miquitório”, Analise essa frase. Além de horrível, adiciona uma formalidade grotesca e desnecessária na hora de mijar.
Sem falar naqueles que param pessoas na rua, olham com ar de insignificância e as perguntam: __ Por obséquio, poderia me informar as horas? Dá vontade de não responder.
Mas ódio de verdade, tenho das pessoas que nunca viram a outra na vida e mesmo assim, agem com profunda intimidade, geralmente acontece no meio feminino: __ Olá coração! __Tudo bem meu amor? __Imagina delícia! __Por nada fofinha... É um rasga ceda de enojar, e nós que olhamos de fora, ficamos ali, tentando descobrir qual delas parece ser a mais falsa.
Sem causas para espanto, existe também o outro lado da história, as pessoas nada formais, e por incrível que pareça este lado além de engraçado é um tanto irônico.
Coisa de uns dias, seguia viagem num coletivo ligeiramente abarrotado, acolhi-me num dos primeiros bancos, próximo ao motorista. Ponto adiante, uma senhora na casa dos 90, já fazendo horas extras, curvada e aparentemente sensível, assinalou com vigor, o ônibus pára, a senhora franzi as sobrasselhas e sobe num pique só.
Ouço o motorista dizer: __ Senhora, esses ônibus são modernos, a senhora precisa mostrar a identidade para a câmera filmar, ali na frente. Atordoada e com pouca paciência a velha enruga um pouco mais a testa em expressão de ódio e surpreende meia centena de passageiros ali presentes.
Ouço a senhora dizer: __ Hááá, mostrar pra câmera? Olha o que eu mostro pra câmera, diz a velha esticando com força o dedo indecente.
Pasmos, os passageiros num só coro diziam: __ Óóóóóóó....
Sem tomar fôlego, a velha complementa baixando ainda mais o nível: __ E o senhor, é um motorista veado e filho da puta, vai-te a puta que pariu e enfia a câmera e o ônibus no meio do olho do seu cú...
Após segundos de xingamentos pela voz aguda e trêmula daquela senhora, pensando já ter visto tudo de pior, a velha surpreende todo o coletivo novamente, desta vez, levantando sua blusa de tricô e mostrando para a câmera um par de seios murchos, de dar inveja a qualquer cadáver.
Depois de tudo, repensei meus questionamentos. E comparando as cenas formais por mim vistas e aqui contadas, com o desacato sexual de uma senhora de 90 anos de idade que já esqueceu o que é formalidade, qualquer um pode concluir que é preferível optar pelo meio termo. Nem mais formal, nem menos formal. Sejamos apenas normais.

Thiago Sicuro.

sábado, 5 de julho de 2008

A ARTE DE SER POBRE.

Algumas vezes fica impossível da gente tentar esquecer que é pobre. Um dia desses por exemplo, cheguei em casa depois de um daqueles dias longos e ingratos, desejando um banho com toda força de uma alma cansada. Arranquei o cinto puxando-o com uma das mãos enquanto a outra desabotoava com pressa a camisa suada, arremessei distante os sapatos usando o impulso feito com os pés, um para cada lado, não há sensação melhor que essa para quem quer esquecer que viveu um dia ruim.
Por fim, já munido de roupas limpas, toalha seca e uma cueca cheirosa, dirigi-me com pressa ao banheiro, sem mesmo dar boa noite aos que presenciaram minha passagem de entrada pela sala, já que não há outra porta que leve ao único banheiro da casa. Após uns quase trinta segundos tentando trancar a porta do banheiro, que além de sanfonada, estava emperrada, empenada, depenada e desalinhada, consegui um lugarzinho debaixo do chuveiro para tomar meu tão esperado banho. Antes disso, o aguardado e tradicional choque do registro, que por um momento breve me fez esquecer da água gelada que caíra lenta e pingante.
Ensaboa pra cá, lava pra lá, e como todo ser humano que se julgue normal, por mais que eu conheça cada quadrado de azulejo do banheiro, inicio um processo de reparação do ambiente, onde observo ao lado do espelho gasto, duas calcinhas molhadas, uma amarela e outra marrom (ou que um dia já foi branca), provavelmente uma de propriedade da minha irmã e outra de uma assídua amiga freqüentadora de minha residência, já que os tamanhos eram diferentes. Mais ao lado, na prateleira de plástico, um outro sabonete, este bem encabelado, e uma pasta de dentes apertada bem no meio, que raiva isso me dá.
Esfrega por cima, enxágua por baixo, e lá vêm o grito maternal alertando o fim do banho: Sááááái daí garoto que seu pai tá quase se cagaaaaaando!!! Agora, já não mais apressado e sim assustado com uma possível tragédia fecal, sem hesitar lancei-me de box à fora. Tentando descolar da bunda a cortina de plástico molhada, acabei deixando a toalha cair numa poça d’água, e o que antes era seco, agora se faz encharcado, molhando ainda mais um corpo que só queria descanso.
Finalmente fora do banheiro, encontro o desodorante sobre a mesa da cozinha, ou creme de suvaco como diz meu irmão. Aplico uma leve camada debaixo dos braços e sigo para cama com as axilas dominadas pelo cheiro hipnótico da alfazema.
Deitei, nesse instante meu corpo demasiado pela dor lombar, me concede um alivio inexplicável por palavras que conheço. Ajeito o travesseiro, fecho os olhos, e ouço vozes. Pergunto ao meu eu: __Ué, ainda nem dormi e já estou sonhando? Meu eu responde: __ Não, é sua irmã, uma amiga e uma amiga da amiga dela conversando.
Numa hora dessas a gente tenta desconsiderar pra dormir logo, mas é impossível. Pior de tudo que o papo nem era cabeça. Diziam: __ Cara, minha menstruação jorra. __ Hum, a minha sangra de pingar... Penso eu: Ainda bem que hoje vou dormir sem jantar.
Encolhi-me no cobertor e devagarzinho as vozes foram sumindo, sumindo, sumindo, até que adormeci.
Naquela noite sonhei que era rico, mas nem era tão feliz. Acordei e percebi que a pobreza vem acompanhada de improvisos, criatividade e além de tudo, muito bom humor. O pobre é assim mesmo, pra tudo dá-se um jeito, nada é perdido, tudo é aproveitado, vive apenas com a seriedade necessária. Já dizia um antigo ditado feito aos pobres: Pra que levar a vida a sério se a gente nasceu de uma gozada?

Thiago Sicuro